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31/05/2021

Um projeto para conhecer e mapear o Brasil.

O Projeto Radam, criado em 1970 como um programa de sensoriamento remoto do território brasileiro com finalidade de efetuar um levantamento sobre os recursos naturais de uma área da Amazônia, em 1975 passou a abranger todo o país e recebeu a denominação de Projeto RadamBrasil. No final da década de 1970 os levantamentos já estavam sendo realizados em Mato Grosso do Sul.
Neste artigo, a geógrafa Ângela Laurino explica um pouco a estrutura e as metodologias adotadas nos trabalhos cujos resultados serviram também para estudos do potencial de MS e de ações para seu desenvolvimento.

 

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RADAM/RADAMBRASIL

 

Um projeto para conhecer e mapear o Brasil

Ângela Antonieta Athanázio Laurino*

 

Que projeto é esse?

De abrangência nacional, o Projeto RADAM (RADar na AMazônia) iniciou seus trabalhos em 1970 como parte da estratégia, na época, de desenvolvimento da Amazônia e posteriormente do Nordeste, a fim de mapear seus ecossistemas. Fazia parte de um plano maior denominado Plano de Integração Nacional (PIN).

Segundo Mario Ivan Cardoso de Lima – que publicou em 2008 o “Projeto Radam: Uma Saga na Amazônia” – “Tudo começou em 29 de outubro de 1970, através da criação da Comissão de Levantamento Radargramétrico da Amazônia (Cadram), no âmbito do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) do Ministério das Minas e Energia. Como primeira indicação através de técnicos do DNPM, em razão dos excelentes resultados auferidos no Quadrilátero Ferrífero (MG) pelo projeto SERE do INPE/NASA, foi idealizada uma área teste de 44.000 km2, na bacia do rio Tapajós, nos domínios da rodovia Transamazônica (BR 230). No entanto, os entendimentos evoluíram e a primeira área coberta foi de 1.500.000 km2, paulatinamente ampliada até atingir toda a Amazônia Legal Brasileira e parcelas orientais dos estados do Maranhão, Piauí, Minas Gerais e Bahia, até 1975. A partir daí, em razão da qualidade dos produtos obtidos, foi estendida para o restante do Brasil, sob a denominação de Projeto RadamBrasil”.

Com a evolução da terceira ampliação do projeto, em julho de 1975, alcançou todo o território Nacional a fim de realizar o Mapeamento Temático Integrado dos Recursos Naturais, fato inédito em países do então terceiro mundo.

 

A estrutura do trabalho

A estrutura administrativa, quando da primeira fase, envolveu essencialmente a região Amazônica e os escritórios base eram em Belém, Manaus e Rio de Janeiro. Já na segunda fase, para o restante do país, a sede passou a ser Salvador, com bases de apoio em Goiânia, Rio de Janeiro, Florianópolis e Natal, sendo desativada a base de Manaus e transferida a de Belém para Salvador.

As características climáticas da região amazônica, com uma grande quantidade de nuvens durante longos períodos do ano, foi um dos fatores determinantes, para a escolha do Radar de Visada Lateral. Esse sensor – acoplado a uma aeronave Caravelle, com velocidade de 700 km/h a uma altura de 11.000 a 12.000 metros – foi determinante para obtenção das imagens. Um dos apoios para as operações de aerolevantamentos que ocorreram de 5 de novembro de 1975 a 6 de dezembro de 1976 foi o aeroporto de Campo Grande.

Além das imagens utilizadas para a elaboração de diversos temas, da bibliografia disponível e dos trabalhos de campo necessários para dirimir dúvidas, foram utilizados helicópteros, aeronaves bimotores de asa alta, barcos e veículos utilitários como jeep, perua veraneio, caminhonete entre outros.

Pela metodologia desenvolvida, o arranjo espacial de trabalho era compreendido na “Carta do Mundo ao Milionésimo”, abrangendo um retângulo de 6 x 4 graus, paralelos e meridianos, independente dos limites políticos administrativos (escala 1:1.000.000) para posterior publicação dos mapas temáticos. Sua subdivisão foi na escala 1:250.000, para trabalhos de campo e escritório com um intervalo de 1 grau x 1 grau e 30 minutos, portanto cada carta de 1:1.000.000, possui 16 cartas de 1:250.000.

 

As metodologias adotadas

Com relação às metodologias utilizadas, exigiu-se a criação de uma nova forma de trabalho para cada tema. Um verdadeiro desafio técnico a ser enfrentado para a interpretação das imagens de Radar, levando-se em consideração o que se tinha de tecnologia na época. Assim, o trabalho foi segmentado por sete Divisões.

Divisão de Geologia (Digeo) – Além de fornecer subsídios geológicos às demais divisões e cuidar da elaboração de mapas, a Digeo apresentava uma gama de indicações de suporte técnico entre elas: cadastramento de minas, jazidas e jazigos fossilíferos, ocorrência de minerais, prospecção e avaliação de recursos minerais etc. Mais uma vez Mario Ivan Cardoso de Lima, com sua “Metodologia Sistemática de Elementos Radargráficos (SER)”, inédita em termos mundiais, deixou novo legado de trabalhos. Com base em todo o aprendizado e experiências de muitos anos, o IBGE editou o Manual Técnico de Geologia 1998.

Divisão de Geomorfologia (Dimor) – Com sua cartografia geomorfológica, através dos conhecimentos vivenciados, deu origem a uma metodologia própria com o “Mapa Geomorfológico” tendo resultado também em um “Manual Técnico de Geomorfologia”, editado pelo IBGE, 2a. Edição 2009.

Divisão de Pedologia (Diped) – Em decorrência da extensão territorial do Brasil e do prazo disponível para o levantamento do tipo exploratório, esta divisão elaborou o “Mapa Exploratório de Solos”. Também foi editado pelo IBGE um “Manual Técnico de Pedologia e o Guia Prático de Campo”, 2015, 3a. edição.

Divisão de Vegetação (Diveg) – Como no mapeamento Fitoecológico com imagem de Radar de Visada Lateral nem todas as feições são mostradas, foram efetuados sobrevoos a baixa altura, incursões a campo entre outras técnicas responsáveis pelo “Mapa de Vegetação” e relatório, sendo produzida a Carta Bioclimática da região. Também foi publicado pelo IBGE o “Manual Técnico da Vegetação Brasileira”, na sua 2a. edição revisada e ampliada, 2012.

Divisão de Uso Potencial da Terra (Dupot) – O trabalho integrado desta divisão era, em síntese, o cruzamento dos mapas geomorfológicos, exploratório de solos e dados climáticos, que indicavam o uso adequado das terras conforme sua aptidão. Além da bibliografia específica eram utilizados os Censos Agropecuários e a Produção Agrícola Municipal (PAM), ambos publicações do IBGE, com ajustes em operações de campo. Com o relatório “Capacidade de uso dos Recursos Naturais Renováveis” e mapa, esses elementos – mapa e relatório – seriam os embriões dos atuais Zoneamento Ecológico Econômico ou Potencial Geoambiental. O “Manual Técnico do Uso da Terra”, publicado pelo IBGE, está na 3ª edição, 2013.

Divisão de Cartografia (Dicar) – Consistia no apoio cartográfico a todas as divisões. Era praticamente a primeira que ia a campo. Com a expansão do projeto para RadamBrasil, esta equipe pode também utilizar as Bases Cartográficas do Departamento do Serviço Geográfico do Exército (DSG) na escala 1:100.000, editadas entre 1968/69, e também as bases cartográficas do IBGE, na mesma escala.

Divisão de Publicação (Dipub) – Todos os mapeamentos temáticos eram elaborados na escala 1:250.000 e, posteriormente, encaminhados a esta divisão localizada no Rio de Janeiro e encarregada do produto final, ou seja, o mapa na escala 1:1.000.00 e o relatório técnico. Este produto constituiu a Série “Levantamento de Recursos Naturais (LRN)”, no total de 38 publicações. Anteriormente 34 haviam sido disponibilizadas em papel. Hoje, todos os volumes estão disponíveis em forma de CD-Rom, edição facsimilar pelo IBGE.

 

 O Projeto RadamBrasil em Mato Grosso do Sul

No final da década de 1970 equipes multidisciplinares de campo já estavam fazendo seus levantamentos em terras de Mato Grosso do Sul, cujos trabalhos foram intensificados no início dos anos 1980. Eram equipes vinculadas à base de apoio de Goiânia e Florianópolis.

Os técnicos da área de Cartografia iniciaram os trabalhos em março de 1980, havendo registros das equipes de geologia a campo em setembro de 1978. No Estado, o primeiro usuário de dados do RadamBrasil, mesmo antes das publicações, foi a Empresa de Pesquisa e Assistência Técnica e Extensão Rural (Empaer), no início da década de 1980.

Os volumes e suas publicações correspondentes ao Estado de Mato Grosso do Sul são os seguintes: Vol. 27 - Folha Corumbá, 1982; Vol. 28 – Folha Campo Grande, 1982; Vol. 31 – Folha Goiânia, 1983; e Vol. 37 – Folha Paranapanema, este posteriormente publicado em meio digital.

Este trabalho técnico foi o embasamento assim como suas equipes, para que o Governo do Estado firmasse em 1984, um convênio com o Projeto RadamBrasil, posteriormente incorporado ao IBGE, para que fosse realizado um grande estudo, na época inédito no Brasil, denominado “Estudos Integrados do Potencial dos Recursos Naturais de Mato Grosso do Sul”.

Conforme o Decreto n. 90.826, de 22 de janeiro de 1985, foi tentada a institucionalização do Projeto RadamBrasil, através da criação do FundamBrasil, porém como o IBGE possuía equipe com perfil semelhante a esse, foi incorporado através do Decreto n. 91.295, de 31 de maio de 1985.

 

* Ângela Antonieta Athanázio Laurino é mestre em Geografia e associada efetiva do IHGMS, cadeira 32 (patrono: Ângelo Jayme Venturelli). Entre os anos de 1977 e 1983 participou de equipes de trabalho do Projeto RadamBrasil.

 

Autor: Ângela Antonieta Athanázio Laurino

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