Artigos

12/07/2022

Inocência - romance-símbolo do MS

 

 

LITERATURA

 

Inocência: romance-símbolo de MS

Arnaldo Rodrigues Menecozi*

 

4 de julho entrou para o calendário de eventos de Mato Grosso do Sul como “Dia de Inocência” em 2007 quando foi sancionada a Lei n. 3390 tornando a obra literária “Inocência”, o romance-símbolo de Mato Grosso do Sul.

Escrita pelo Visconde de Taunay, mesmo autor de “A Retirada da Laguna”, o livro retrata o amor impossível entre Cirino e Inocência. Trata-se de uma ficção em que todos os personagens são baseados em pessoas que o autor conheceu na região do atual município de Paranaíba. Neste artigo o professor Arnaldo Menecozi contextualiza a edição publicada em 2006 pelo IHGMS com atualização, notas e referencial histórico.

.............................................................................................................................

 

O livro

O livro “Inocência” foi escrito pelo Visconde de Taunay. Retrata o sentimento arrebatador que ele sentiu pela jovem Jacinta Garcia, pelos idos de 1867, quando voltava da “Retirada da Laguna”, episódio relativo à guerra com o Paraguai, entre 1865 e 1870.

O contexto amoroso, descrito por Taunay, envolve o amor impossível entre Cirino e Inocência. Impossível porque a jovem sertaneja, que vivia isolada em seu quarto, fruto da cultura conservadora e autoritária do pai, já estava consentida em casamento para o capataz Manecão.

Entra em cena o médico Cirino, desconhecido, e que se hospeda na casa do senhor Pereira, pai de Inocência (Jacinta Garcia), com a finalidade de curar a moça que sofria, há dias, com febre. O resultado desse encontro foi a paixão por ela.

Taunay relatou em outro livro, “Memórias”, que a personagem Inocência surgiu a 4 de julho de 1867, quando uma moça, “na primeira flor dos anos, e tão formosa”, lhe serviu café na casa de João Garcia, ficando ele pasmado, enleado, positivamente de boca aberta. Tão grande a minha admiração que o velho pôs-se a rir: – Então acha bonita a minha neta?”

– “Com efeito – foi só o que pude responder.”

O avô da jovem sertaneja ainda lembrou que “daqui a três semanas casa-se com um primo”. Além disso, levantou-lhe um tufo de cabelos, mostrando o lóbulo da orelha direita roxeado.

O que Taunay registra em “Memórias” é a condenação de Inocência “a ser pasto da repugnante lepra”! A descrição que Taunay faz de Inocência é de uma beleza angelical: “Do seu rosto irradiava singela expressão de encantadora ingenuidade, realçada pela meiguice do olhar sereno que, a custo parecia coar por entre os cílios sedosos a franjar-lhe as pálpebras, e compridos a ponto de projetarem sombras nas mimosas faces. Era o nariz fino, um bocadinho arqueado; a boca pequena e o queixo admiravelmente torneado”.

Todos os personagens criados por Taunay são reais, ou seja, pessoas que conheceu na região dos Garcias, sendo a expressão registrada por Francisco Leal de Queiroz no prefácio da obra “Inocência”, em edição histórica, publicada pelo IHGMS: “Inocência não é uma obra de ficção. É, sim, a história verdadeira de alguns de nossos antepassados (que serviram de protótipo), de nossos usos e costumes, tendo nossa terra como cenário, urdida com fios de ficção (nisto o autor foi sumamente feliz), o que dá à obra este toque de perene atração e magia”.

 

O autor

Alfredo Maria Adriano d’Escragnolle Taunay, o conhecido Visconde de Taunay, nasceu no Rio de Janeiro, em 1843, falecendo, na mesma cidade, em 1898. Filho de família aristocrática francesa estudou no Colégio Pedro II, depois na Escola Militar, e, como segundo-tenente participou da Expedição de Mato Grosso (1865-1868). Era o início da Guerra com o Paraguai, de onde efetuou seus apontamentos, surgindo livros, como “A Retirada da Laguna” e “Inocência” . Foi senador, deputado e presidente de Santa Catarina, presidente do Paraná, deputado por Goiás, além de desenvolver intensa atividade cultural e política.

Com quase 23 anos conheceu as terras mato-grossenses, isto a 24 de novembro de 1865, quando era tenente-engenheiro da Força Expedicionária de Mato Grosso, entrando pela região de Baús, chegando, logo depois, a Coxim.

O objetivo desse deslocamento era alcançar a região de Laguna, no Paraguai, para engrossar as fileiras dos combatentes contra a nação guarani. No início de 1867, a 25 de fevereiro, foi quando Taunay avançou sobre Laguna, resultando na famosa “Retirada”, concluída a 11 de junho, no porto Canuto, à margem esquerda do rio Aquidauana, hoje município de Anastácio.

Como Taunay era exímio observador, anotou tudo quanto pôde, mesmo considerando seus 24 anos e os tormentos da guerra. De seus escritos, posteriormente, surgiram “A Retirada da Laguna”, “Inocência”, “Viagens de Outrora”, “Memórias”, “Campanha de Mato Grosso (Cenas de Viagem)”, “Dias de Guerra e de Sertão”, “Em Mato Grosso Invadido”, “Marcha das Forças”, “Entre os Índios do Sul de Mato Grosso”.

 

Paranaíba

O contexto geográfico de “Inocência” se dá no atual município de Paranaíba, então chamado Sant’Anna do Paranaíba (não confundir com o município de Inocência, que não existia na época – de 1936 a 1943 chama-se São Pedro, distrito de Paranaíba –, sendo emancipado a 17 de novembro de 1958, pela Lei Estadual n. 1129).

Em 1838, o povoado de Sant’Anna do Paranaíba foi elevado a distrito de paz por Mato Grosso, embora a província de Goiás estivesse pleiteando a região como parte de seu território. A elevação a município (na época a denominação era vila) ocorre em 1857, quando Sant’Anna do Paranaíba torna-se o centro da região, com bastante movimento comercial com cidades paulistas e considerável criação de gado.

 

Dia de Inocência

Da importância da obra “Inocência”, não só para a terra paranaibense, Mato Grosso do Sul pode se orgulhar de ser o lócus de onde todo o enredo foi tramado, sendo considerada o melhor romance sertanejo do Romantismo, como registrou Alfredo Bosi, em 1972, que “nada há que supere Inocência em simplicidade e bom gosto”. Além disso, na leitura de “Inocência”, cada sul-mato-grossense pode se identificar nos detalhes deste rincão tão bem descrito por Taunay. 

Dada a tanta relevância que a obra consubstancia e representa Mato Grosso do Sul, a então deputada estadual Celina Jallad (1947-2011), elaborou projeto de lei, em 2007, para que se estipulasse o “Dia de Inocência”.

O projeto foi sancionado em Paranaíba no dia 4 de julho de 2007, publicado no Diário Oficial do dia seguinte (5 de julho) e transformado em Lei, de n. 3390, tornando a obra literária “Inocência”, o romance-símbolo de Mato Grosso do Sul.

Pelo artigo 2 ficou criado o “Dia de Inocência”, a ser comemorado no dia 4 de julho, cuja data foi escolhida porque foi nele que, em 1867, Taunay conheceu a jovem Jacinta Garcia na casa do avô dela, no sertão de Sant’Anna do Paranaíba.

Na época da aprovação da lei, a então deputada Celina Jallad, assim se manifestou: “Inocência, uma obra desconhecida para muitos sul-mato-grossenses, há muito seduz o mundo e declarar Inocência o romance-símbolo de MS é um justo presente para a cultura e a história desta brava gente do Bolsão, em especial do povo de Paranaíba”.

O Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul tem, à disposição dos interessados, a edição histórica de “Inocência”, com atualização, notas e referencial histórico do professor Hildebrando Campestrini.

 

* Arnaldo Rodrigues Menecozi é professor da Rede Municipal de Ensino de Campo Grande.

Montagem.jpg

 

 

 

 

.......................................................................................................................................

 

 

Livros na Praça

 

DiaEscritor2019_02.jpg

 

25 de julho é o Dia Nacional do Escritor. Para marcar a data, o IHGMS realiza mais uma edição do projeto “O Instituto Histórico e Geográfico vai aonde o povo está”. Implantado em 2018 sob coordenação da associada Iolete Moreira, por conta da pandemia de Covid 19 foi suspenso em 2020 e realizado de modo restrito em 2021 com entrega de aproximadamente 600 exemplares de obras de autores regionais e nacionais à Agência de Administração Penitenciária de MS (Agepen) para o projeto “Remição pela Leitura” que proporciona aos custodiados nos estabelecimentos penais estaduais a possibilidade de redução em suas penas.

Neste ano a iniciativa volta em seu modo original em ambiente aberto com presença de público e programação cultural que inclui música, poesia, contação de histórias, performance poética e, claro, distribuição de livros. Será no próximo dia 22 (sexta-feira), das 9 às 17 horas, na Praça Ary Coelho. Abrindo a programação apresenta-se o Coral Fronteiras Abertas, criado pelo professor Américo Calheiros, sob a regência do maestro Orion Cruz. Na sequência, apresentações do poeta performático Ruberval Cunha e das poetas e professoras Carmem Lúcia e Nena Sarti. Na oportunidade também serão entregues kits de livros à Biblioteca Estadual Isaias Paim, à Biblioteca Municipal Anna Luiza Prado Bastos, à União Brasileira de Escritores de MS e à Gibiteca. Receberá o troféu Escritor Nota 10 o(a) apoiador(a) que doar o maior número de exemplares ao projeto.

 

Foto: Arquivo IHGMS

Apresentação cultural na primeira edição do projeto que contou também com participação de escolas.

 

Autor: Arnaldo Rodrigues Menecozi

Artigos RELACIONADAS

67 3384-1654 Av. Calógeras, 3000 - Centro, Campo Grande - MS, 79002-004 ┃ Das 7 às 11hs e das 13 às 17hs, de segunda à sexta-feira.

Site Desenvolvido por: