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18/04/2022

O choro e o genial Pixinguinha.

“Meu coração não sei porque bate feliz quando te vê...”
Quem, ao ouvir os primeiros versos de “Carinhoso”, não lhe vem à mente a figura inconfundível de Pixinguinha com seu saxofone?

No dia 23 de abril, data de nascimento desse gênio da música brasileira, comemora-se o Dia Nacional do Choro.
Neste artigo, o pesquisador Celso Higa relembra um pouco da trajetória
do artista e das origens do gênero do qual foi precursor.

 

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MÚSICA

 

O Choro e o genial Pixinguinha

Celso Higa*

(engenheiro eletricista, economista e pesquisador regional, associado do
Instituto Histórico e Geográfico de MS (cadeira n. 5 – patrono: Emílio Schnoor).

 

 

Na segunda metade do século XIX, surgiram no Rio de Janeiro (RJ) os primeiros conjuntos de choro. Nome este decorrente do estilo plangente, choroso, que a música em três partes trazia. A maioria desses pequenos grupos de músicos, eram compostos por modestos funcionários das repartições públicas como a Alfândega, o Corpo de Bombeiros, dos Correios e Telégrafos, da Estrada de Ferro Central do Brasil, que se reuniam nos subúrbios cariocas ou nas residências do bairro da Cidade Nova, onde muitos moravam. Esses encontros funcionavam como uma confraternização de pessoas da classe média baixa, no Segundo Império (1840-1889). As mais antigas referências a esses grupos de músicos citam o nome do flautista e compositor Callado – Joaquim Antônio da Silva Callado – como o iniciador e organizador desses primeiros conjuntos. É dele o choro “Flor Amorosa”. Como propulsores desse movimento estavam, também, os pianistas Ernesto Nazareth e Chiquinha Gonzaga; o maestro Anacleto de Medeiros, da banda do Corpo de Bombeiros, que compuseram quadrilhas, polcas, tangos, maxixes, xotes e marchas. Acrescentam-se Viriato Silveira, Sátiro Bilhar, Patápio Silva, Mário Cavaquinho, Cândido Trombone, Irineu de Almeida e outros criaram os pilares do choro. No início, o ritmo era composto basicamente por flauta, violão e cavaquinho, instrumentos que chegaram ao Brasil junto com a corte portuguesa. A flauta era solista, o cavaquinho segurava o ritmo como “centro” e o violão nos bordões das cordas, fazia a “baixaria”. Os grupos de instrumentistas eram denominados “chorões” e havia os pontos tradicionais de encontros na cidade: Largo do Machado, Largo do Estácio, Largo do Catumbi, Largo do Portão Vermelho, Largo da Cancela e no botequim Braço de Ouro, que ficava no Engenho Velho.

Herdeiro de toda essa tradição musical, Pixinguinha, foi aquele que melhor soube mesclar as músicas europeias com a influências culturais do país, notadamente na negritude maliciosa do lundu, ritmo com base percussiva do som africano.

Consolidou o choro como gênero musical, levando o virtuosismo na flauta e aperfeiçoando a linguagem do contraponto com seu saxofone organizando inúmeros grupos musicais, tornando-se o maior compositor do gênero, num momento que a difusão do rádio foi ganhando todo o território nacional.

 

ACONTECIMENTOS EM 1897

Alguns registros no ano de 1897, informam da inauguração da linha submarina de telégrafo entre Rio de Janeiro e Pernambuco; em Salvador (BA), primeira linha de bondes elétricos, unia os bairros do Comércio e Itapagipe. Também lá no sertão baiano, ocorria a sangrenta Guerra de Canudos (1896-1897). Aqui, no então Matto-Grosso, foi implantada a Usina do Itaicy, no município de Santo Antônio de Leverger, que além da produção industrial da cana-de-açúcar foi uma das pioneiras na geração de energia elétrica no país.

 

TRAJETÓRIA DE PIXINGUINHA

1. Onde nasceu, batizou, onde morou

A Lei Áurea, com a abolição da escravatura, não havia completado dez anos de existência, quando nasceu em 23 de abril de 1897, no bairro suburbano da Piedade, zona norte do Rio de Janeiro (RJ), aquele que seria considerado o ápice do choro, gênero musical genuinamente brasileiro: Alfredo da Rocha Vianna Filho. O filho de Alfredo da Rocha Vianna e Raimunda Maria da Conceição seria o caçula dos nove filhos do casal. Raimunda teve quatro filhos de um casamento anterior. Foi batizado na Igreja de Santana, no bairro Cidade Nova mas a sua infância no bairro do Catumbi, onde seus pais tinham um casarão de oito quartos e quatro salas, na Rua Vista Alegre, foi vital para a sua formação musical e de compositor.

Conhecida por Pensão Vianna, o imóvel tinha um porão habitável que fora alugado para os amigos do locador. O pai de Pixiguinha que também se chamava Alfredo, era flautista amador nas horas vagas e funcionário do batente na Repartição Geral dos Telégrafos. Por lá, Alfredo pai recebeu: Sinhô (José Barbosa da Silva), Bonfiglio de Oliveira, Irineu Batina (Irineu de Almeida), Candinho do Trombone, Quincas Laranjeiras, Neco e outros. Até Heitor Villa-Lobos foi lá dar uma espiada, pois admirava os chorões daquele tempo.

 

2. Bambas e influência do choro

Entusiasmado com o talento progressivo do filho, o “seu” Vianna comprou uma flauta para aquele menino que absorveu as influências sonoras do seu tempo. Seu apelido, Pixinguinha, consolidado pelo mix de Pizindin (como a avó que falava esquisito o chamava de menino bom) e Bexiguinha (por ter adquirido varíola ou bexiga) pegou. Seu talento foi atraindo atenções, sendo convidado a participar do rancho carnavalesco Filhas da Jardineira em 1911. Neste, Pixinguinha conheceu Donga (Ernesto Joaquim Maria dos Santos) e João da Baiana (João Machado Guedes), iniciando uma amizade que perdurou até o fim da vida. Na opinião de Hermínio Bello de Carvalho, o trio inseparável eram os “três reis magos” da música popular brasileira. Donga, junto com Mauro de Almeida, compôs o primeiro samba gravado, o “Pelo telefone”. Ainda em 1911, começou a tocar nos fins de semana em bailes e quermesses do bairro e fez sua primeira composição, o choro de três partes intitulado “Lata de leite”. Em 1912, como diretor de harmonia participou do rancho Paladinos Japoneses.

 

3. Empregos nas boates, cassinos e cinemas

Num tempo em que não havia Juizado de Menores, no seu primeiro emprego, o músico tocou na choperia La Concha. Depois, no ABC e no Cabaré Cassino, ambos na Lapa; boate O Ponto, na Praça Tiradentes, todos na região central da cidade. Em substituição a um flautista adoentado integrou a orquestra do Cine Teatro Rio Branco, no tempo do filme mudo. Passou a se apresentar em circos, teatros e outras orquestras de cinema. Ainda nos carnavais integrou o Grupo de Caxangá, conjunto instrumental organizado por João Pernambuco, que vestidos de sertanejos executavam toadas e cateretês.

Quando seu pai faleceu, em 1917, Pixinguinha já era famoso nas rodas de samba e choro da cidade, frequentando a casa de Tia Ciata na Praça Onze. Na época, o choro era bem vindo, o samba não. O choro era tocado na sala, o samba nos quintais do fundo e terreiros.

A epidemia da gripe espanhola afugentou os admiradores da sétima arte e os cinemas buscaram novos atrativos para o aumento dos frequentadores dessas salas. O gerente do Cine Palais, Isaac Frankel, convidou e solicitou que o Alfredo Filho organizasse um novo grupo, com músicos oriundos do Caxangá, a tocarem no hall do cinematógrafo. Estava criado “Os Oito Batutas” em 1919, composto por: Pixinguinha (flauta), Donga (violão), China (vocal, violão e piano), Nelson Alves (cavaquinho), Luis de Oliveira (bandola e reco-reco), Raul Palmieri (violão), Jacó Palmieri (pandeiro) e José Alves (bandolim e ganzá). O grupo era tão bom que era uma atração à parte, fazendo mais sucesso que os próprios filmes exibidos. O povo se aglomerava na porta do cinema para ouvi-los tocar e, no recinto, eram elogiados por notoriedades como Ernesto Nazareth, Rui Barbosa e Arnaldo Guinle.

 

4. Arnaldo Guinle, Duque, convite para a apresentação em Paris,
Os oito batutas no Sherehazade

Tocaram no elegante cabaré Assírio, no subsolo do Teatro Municipal onde acompanhavam os dançarinos Duque e Gaby. Duque (Antônio Lopes de Amorim Diniz), baiano de Salvador, coreógrafo, teatrólogo, jornalista, letrista e compositor, era muito conhecido nas capitais europeias por difundir a dança do maxixe, considerado vulgar no Brasil. Intermediou junto a Arnaldo Guinle, empresário e desportista de família renomada no Rio de Janeiro, apresentação dos Batutas na capital francesa. No dia 18 de janeiro de 1922 embarcaram para Paris, custeados por Guinle. Um dos componentes não viajou por motivo de doença e lá fora, o conjunto ficou denominado “Les Batutas”. Fizeram tanto sucesso na dancing Sherehazade, uma badalada casa noturna de Paris, que a temporada prevista para um mês, prolongou-se por um semestre.

Para enfrentar o rigoroso frio parisiense, foram providenciadas na Cidade Luz roupas apropriadas (levaram ternos de clima tropical) e consumiram no primeiro mês 120 garrafas de rum Negrita.

Bandas americanas de jazz, que por lá tocavam, impressionaram os batutas com um estilo de música e instrumentos de sopro que não conheciam, como saxofone, pistom e clarineta. Pixinguinha ganha do mecenas Arnaldo Guinle um saxofone de presente.

 

5. Encontra Betí

Depois de Paris, o grupo vai para apresentações na Argentina, já incorporado com novos instrumentos. Na volta, com o fim do grupo, Pixinguinha inicia outra atividade, ligada ao teatro de revista. Como maestro da orquestra de 20 músicos do Cine Rialto, acompanha em 1926 o espetáculo “É tudo Preto” da Companhia Negra de Revista, do cantor De Chocolat e o cenógrafo Jaime Silva. O elenco era quase todo formado por artistas negros. Nos ensaios, o maestro conheceu a paraense Betí (Albertina Nunes Pereira), cujo nome artístico era Jandira Aimoré. Eles se casam em 1927 e nos anos seguintes, por problemas de fertilidade do casal, adotaram um bebê que recebeu o nome de Alfredo da Rocha Vianna Neto, o Alfredinho.

 

6. Bares que frequentou

Quanto a bares, tinha os seus preferidos: o “Bar da Portuguesa”, perto de sua casa em Ramos, que ia com a esposa Betí, degustar os pratos e petiscos famosos do recinto, que ia do torresmo, bolinho de bacalhau, jiló a sardinha frita. Esse bar recebeu o selo de Patrimônio Cultural Carioca no ano passado (2021), dado pela Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, no circuito Bares e Botequins. Tem na calçada em frente, uma estátua dele sentado na mesa, criada em 2016, pelo campo-grandense Ique (Henrique Woitschach), o mesmo que fez a do nosso poeta Manoel de Barros em Campo Grande (MS). Em 30 de maio de 1956, a rua Belarmino Barreto da casa onde morava em Ramos, foi rebatizada de Rua Pixinguinha.

No centro, perto das rádios e gravadoras nas quais trabalhava, após o expediente batia ponto na Whiskeria Gouveia (antigo Bar do Gouveia), na Travessa da rua do Ouvidor, onde tinha uma cadeira cativa. Lá encontrava os amigos, bebericava uísque que havia tomado gosto. Não se sabe quem lhe influenciou a tomar... uma hipótese, talvez Vinicius de Moraes que o conheceu desde 1951. Vinicius tinha uma teoria sobre o ditado que “o cachorro é o melhor amigo do homem”, para o poetinha “o uísque é o cachorro engarrafado”... Tem uma estátua tocando saxofone, feita por Otto Dumovich na Galeria dos Empregados do Comércio perto do ponto de encontro.

Quando estava em casa, gostava de carne assada com molho ferrugem que a esposa lhe preparava. Se, depois do trabalho, chegasse nas altas horas, levava um frango assado para a Betí, para se redimir do “alvará” vencido. Uma vez voltando pra casa sofreu um assalto e, ao ser reconhecido pelos meliantes, estes pediram desculpas pelo incidente. Depois de um bate-papo convidou-os para jantar em sua casa. Recebeu uma bronca da Betí, que tinha sido acordada pela bebedeira e cantoria.

Nos últimos três anos de vida, adotou a Confeitaria Deise, como novo “escritório” dos fins de semana em Inhaúma, onde passou a morar... De segunda a sexta, as idas ao Gouveia continuaram sagradas.

 

7. O ocaso de Pixinguinha

No final dos anos 1940, vários problemas se acumularam. Tempos difíceis pelo excesso de bebida, demissão da rádio, prestações da casa atrasadas. Com dificuldade para tocar flauta, por problemas nas mãos e na boca causados pelo alcoolismo e pulmonares pelo tabagismo, Pixinguinha adotou o sax tenor. A carreira seria retomada com uma parceria do flautista Benedito Lacerda e, mais tarde, como estrela central do programa “O Pessoal da Velha Guarda”, na Rádio Tupi. O maestro era funcionário da Prefeitura do Distrito Federal e, para aumentar a renda, ensinava música em escolas dos bairros Saúde e Vila Isabel.

Novos gêneros musicais ditavam o mercado radiofônico, desde a música de cinema com som das big-bands, boleros, bossa nova e a jovem guarda, e isso dava uma sensação de que o choro estava desaparecendo.

Em 1969, vende a casa de Ramos e muda para uma casa alugada em Jacarepaguá. Novas dificuldades financeiras em 1970 fazem com que Pixinguinha e Betí tenham que se mudar novamente, desta vez para Inhaúma, no Conjunto Residencial dos Músicos, bloco 10, apartamento 101.

Já em 1972 quem não andava bem era a Betí. Por problemas cardíacos, ela foi internada no Hospital do IASERJ - Instituto de Assistência dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro em condições nada boas. Em casa, apesar da companhia do filho Alfredinho, da nora e dos netos, sentia muita falta da companheira de 45 anos de convivência. Um dia, sentiu dores no peito e chamou pelo filho que o levou imediatamente para o mesmo Hospital do IASERJ. Examinado pelos médicos, foi determinado também a sua internação. – Betí não pode saber disso, foi logo manifestando a sua preocupação. E Betí nunca soube que o marido estava também doente. Aos domingos, na hora da visita, trocava o pijama pelo terno e subia mais alguns andares para ver a esposa. Para todos os efeitos, estava chegando de casa. Ela morreu em 7 de junho de 1972 sem saber o que acontecia com o marido.

 

8. Leopold Stokowsky

Em agosto de 1940, chega a bordo do navio Uruguay, o maestro Leopold Stokowski e a sua All American Youth Orchestra para dois concertos no Teatro Municipal. O maestro aproveita a estada no Rio de Janeiro para recolher material local com vistas ao Congresso Pan-Americano de Folclore e, assim, pede auxílio a Heitor Villa-Lobos para selecionar um grupo de artistas populares que pudessem gravar exemplares da mais autêntica música brasileira. Num estúdio completo montado dentro do grande salão do transatlântico lá foram Donga, Cartola, Zé da Zilda, Luis Americano, Jararaca e Pixinguinha. Dezessete músicas foram aproveitadas das quarenta gravadas, que foram lançadas comercialmente em dois álbuns da Columbia, denominado Brazilian native music. Os músicos da orquestra americana disseram que nunca viram alguém tocar flauta daquele jeito, referiam-se a Pixinguinha.

 

MÚSICAS QUE RECEBERAM LETRAS

Muitos compositores ousaram encaixar letras nas músicas super elaboradas do Pixinguinha. Deram certo: Gastão Vianna, no lundu “Yaô”; Cândido das Neves, em “Páginas de dor”; Vinicius de Moraes, em “Lamento” e “Mundo Melhor”: em 1962, para a trilha sonora do filme “Sol sobre a lama”, de Alex Viany; Octávio de Souza, na valsa “Rosa”; João de Barro ou Braguinha, em “Carinhoso”; João de Barro e Alberto Ribeiro, em “Cochichando”; Hermínio Bello de Carvalho, em “Fala baixinho”, “Vou vivendo”, “De mal pra pior”, “Protesto, meu amor” e outras tantas; Paulo Cesar Pinheiro, em “Ingênuo”, a preferida de Pixinguinha.

A valsa “Evocação”, tornou-se após “Rosa” com letra de versos parnasianos de Octávio de Souza, um obscuro e sensível mecânico do bairro Engenho de Dentro. Em 1936, Braguinha (também conhecido por João de Barro) fez a letra de “Carinhoso”. Ambas gravadas por Orlando Silva, num disco em 1938.

 

 MÚSICOS: O QUE FALAM SOBRE PIXINGUINHA

Sobre a genialidade e generosidade do músico disseram: “Se você tem 15 volumes para falar de toda a música popular brasileira, fique certo de que é pouco. Mas, se dispõe apenas do espaço de uma palavra, nem tudo está perdido; escreva depressa: Pixinguinha”. (Ary Vasconcelos, crítico e musicólogo); “Choro é o gênero mais evoluído da música brasileira. Existem milhões de choros, mas os bons mesmos são os de Pixinguinha. Bom por estar muito mais elaborado? Não, é porque ele é um sujeito genial!...” (Radamés Gnattali); “Pixinguinha é o melhor ser humano que eu conheço. E olha o que eu conheço de gente não é fácil!” (Vinicius de Moraes).

Músicos, profissionais do meio musical e pesquisadores antigos ou contemporâneos como: Henrique Cazes, Luciana Rabello, Hamilton de Holanda, Bia Paes Leme, Marília Trindade Barbosa, resumiram: nos choros dele percebia-se imagens de pessoas circulando nas ruas, um jogador de futebol dando um drible seco no adversário, marrecos cantando... o que ele tocava era muito cênico. Para Paes Leme, ele era “esponja”: absorvia tudo e saía Pixinguinha.

Foi criador das introduções memoráveis nas marchas carnavalescas gravadas. Ouvindo as introduções de “Taí”, “O teu cabelo não nega”, “Alá-la-ô”, o povo se prepara para soltar a voz nos blocos e nos salões... é tão bonito até hoje, parece uma outra música dentro da música. Num LP dedicado ao Carnaval homenageou no lado A, uma das maiores duplas populares de todos os tempos, João de Barro e Alberto Ribeiro e no lado B, prestigiou o compositor/cartunista Antônio Nássara com seus parceiros em sambas e marchas inesquecíveis.

 

FINAL DE PIXINGUINHA

Ele que tinha flertado com o candomblé e a umbanda, na juventude, tornara-se católico na vida adulta, converteu-se ao protestantismo, seguindo a mulher.

O criador de “Um a Zero” teve o seu primeiro infarto em 25 de junho de 1964 quando as consequências do consumo de bebida e do fumo afloraram. Levado ao Hospital Getúlio Vargas foi diagnosticado com edema pulmonar. Dia seguinte surge complicações cardíacas agravando o seu quadro clínico e foi transferido para o Instituto de Cardiologia Aloísio de Castro, onde permanece por 50 dias, sendo proibido de tocar o seu saxofone, entretanto criou 20 músicas. Tudo era motivo para inspiração, fez: “Mais três dias” (inspirado no tempo que os funcionários lhe diziam que teria a alta hospitalar), “Manda brasa” (o que a cozinheira lhe dizia quando trazia a refeição), “Mascote” (dedicada a uma enfermeira que daria sorte) e "Vou pra casa" (quando recebe alta) , entre outras. No tempo em era bem chegado à pinga, ia sempre a um bar beber antes do almoço. Num dia, olhou para a garrafa de rótulo Virgínia e não quis beber. Foi pra casa e criou “Briguei com Virgínia”...

 

1. A morte na Igreja

Em 17 de fevereiro de 1973 era um daqueles dias maravilhosos para parcela da população: o do desfile da Banda de Ipanema. Um esquenta do bloco duas semanas antes do Carnaval. O fotógrafo Walter Firmo e Hermínio Bello de Carvalho estiveram de manhã na casa de Pixinguinha e saíram para as suas casas a fim de se prepararem para o desfile. Pixinguinha também queria ir a Ipanema mas para batizar o filho de um amigo. O batizado na Igreja Nossa Senhora da Paz estava marcado para as 16 horas, num momento em a Banda se preparava para o seguir no trajeto do desfile. Pixinguinha sentiu dificuldades de respirar e caiu, dez mil pessoas cantavam e dançavam na Banda. Começou a chover forte, como numa reação ao temporal o povo cantou mais alto. Quando chegou a triste notícia da morte do artista a chuva virou um balde de água fria e desanimou absolutamente a festa.

O corpo foi velado no MIS. No dia seguinte, as 16h, em cerimônia simples e rápida e sem encomendação, desceu à sepultura 3868, quadra 60, no Cemitério de Inhaúma, Presentes a cerimônia cantaram “Carinhoso” acenando seus lenços. No dia24 de novembro de 1973, os restos mortais de Pixinguinha, tratados com formol, foram transladados do Cemitério de Inhaúma, em urna lacrada, e enterrados no Cemitério Jardim da Saudade, lote 415, no bairro de Sulacap, onde hoje descansam, ao lado dos de Betí. Juntos, como estiveram toda a vida.

No Carnaval de 1974, no desfile do Grupo 1 das Escolas de Samba do Rio de Janeiro, a vice campeã, G.R.E.S. Portela trouxe o enredo homenageando “O mundo melhor de Pixinguinha”, de Jair Amorim e Evaldo Gouveia, cujo refrão levou o povo a cantar esse samba memorável: “E ele, que era um poema de ternura e paz, fez um buquê que não se esquece mais de rosas musicais”.

 

2. O choro na atualidade

Enfrentando todas as dificuldades o choro não desapareceu. Moldou-se aos novos tempos, aliado aos instrumentos tradicionais alguns grupos inseriram baixo elétrico, guitarra e bateria. Mas as rodas nos moldes antigos continuam agradando mundo afora.

Em 2021, segundo um levantamento do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição - ECAD, o choro “Carinhoso” chegou a marca de 411 gravações registradas, fazendo desta a canção brasileira mais regravada no país em todos os tempos. Suplantou o samba-exaltação “Aquarela do Brasil”, de Ary Barroso.

 

CRÉDITOS

Autores pesquisados

Bibliografia: “Pixinguinha - vida e obra”, de Sérgio Cabral; “Filho de Ogum Bexiguento”, de Marília Trindade Barboza da Silva e Arthur Loureiro de Oliveira Filho; “Pixinguinha - O gênio e o tempo”, de André Diniz; CD “Agô - Pixinguinha 100 Anos” - Síntese das entrevistas feitas no Museu da Imagem e do Som - MIS-RJ, em 6/10/1966 e 22/04/1968; “Samba e Choro”, da Enciclopédia da Música Brasileira; “Pixinguinha - Coleção Folha nº 4 Raízes da Música Popular Brasileira”; CD “Pixinguinha nº 16 - MPB Compositores”, da RGE Discos e Editora Globo; https://projetocolabora.com.br/ods11/rioerua-uma-cronica-da-cidade-de-pixinguinha, de Oscar Valporto; site https://pixinguinha.com.br/vida/ do Instituto Moreira Salles e assuntos correlatos na Internet.

Fotografias

As fotos em preto e branco pertencem ao Instituto Moreira Salles e foram tratadas digitalmente por Rachid Waqued. As coloridas são de Oscar Valporto.

 

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Compositor, arranjador, flautista e saxofonista, Pixinguinha é considerado um dos mais importantes nomes da Música Popular Brasileira. Nas fotos: o artista caminhando no bairro de Ramos (RJ), com seu grupo “Os Batutas” na Argentina em 1922, representado em estátua criada pelo artista campo-grandense Ique, e sempre lembrado nas apresentações do grupo carioca Pixin Bodega cujo nome presta homenagem ao maestro e ao também saxofonista Zé da Bodega. Na ilustração, caricatura do artista utilizada na divulgação do Projeto Pixinguinha lançado pela Funarte na década de 1970.

 

Autor: Celso Higa

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