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05/10/2020

Uma viagem com o Sr. Agostinho Gonçalves da Mota

Uma viagem com o Sr. Agostinho Gonçalves da Mota

                                                                                           Wellington Corlet dos Santos (*)
  


Desde muito jovem, incentivado pelo meu pai, que era militar, comecei a ter interesse pela participação do Brasil na 2ª Guerra Mundial.
Depois, já como oficial do Exército, tive o privilégio de ter tido contato com os veteranos da Força Expedicionária Brasileira – FEB e suas histórias.
Conheci pessoalmente, e fiz amizade, com muitos desses heróis: a Major Elza Cansanção Medeiros, o Sr Marcelino Lúcio Mamedes, o Major Alberto Leite Pessoa, o Cel Sérgio Gomes Pereira, o Cel Osnelli Leite Martinelli, o Sr José Bezerra, e muitos outros.
Um desses heróis é o Sr Agostinho Gonçalves da Mota, Presidente, ou melhor, “Ditador”, da Seção Regional Mato Grosso do Sul da Associação Nacional dos Veteranos da Força Expedicionária Brasileira – ANVFEB / MS.
Conheci o Sr Agostinho nos idos anos de 2001, quando eu era Capitão, Comandante da 9ª Companhia de Guardas, em Campo Grande – MS. Depois disso, ingressei na ANVFEB, como sócio de carteirinha (Sócio Especial nº 13.290) e passei a freqüentar as atividades e a estudar mais a fundo a participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial, a  Força Expedicionária Brasileira e todos esses heróis.
O fato de eu ainda estar na ativa no Exército me levou a vários lugares, com destaque para o Rio de Janeiro - RJ, Campina Grande - PB e Caçapava – SP e, em todos eles, eu pude travar contato com os nossos veteranos.
No final da carreira, já em 2015, estando novamente em Campo Grande – MS, reencontrei o Sr Agostinho e passei, novamente, a freqüentar a Associação Nacional dos Veteranos da Força Expedicionária Brasileira - ANVFEB / MS, desta feita, com muito menos veteranos do que eu havia visto em 2001. E lá estava, firme e forte, o Sr Agostinho, o nosso “Ditador”. Esse apelido, por mais absurdo que pareça, é uma forma carinhosa pela qual ele é conhecido, pelos amigos e associados, porque, desde a fundação da ANVFEB/ MS, ele é o Presidente. 
Juntei-me ao pessoal e pudemos dar um fôlego final à ANVFEB, o que estamos tentando fazer até hoje, com muito orgulho e prazer.
Em uma dessas atividades da ANVFEB / MS, em 2016, eu tive a grata oportunidade de viajar com o Sr Agostinho, de Campo Grande para Aquidauana, para participarmos da gravação de um programa de televisão. Era uma viagem de apenas uma hora e meia.
Até aqueles dias, o Sr Agostinho ainda dirigia sozinho o carro dele, o que perdurou até os seus 93 anos de idade. Entretanto, naquela missão, que seria uma simples viagem, eu fui conduzindo o carro dele, com ele no banco de carona.
Apesar de conhecê-lo há um bom tempo, eu me surpreendi com a bela história de vida dele, belíssimo exemplo para a juventude.
Dizia ele, ser natural de Três Lagoas – MS, tendo nascido aos 7 de maio de 1925, filho de João Vaz da Mota e de Júlia Gonçalves da Mota, e tendo ficado órfão de mãe aos três anos de idade, juntamente com outros cinco irmãos.
Iniciou suas primeiras letras em sua terra natal, em 1931, como escoteiro, na tradicional “Escola 2 de Julho”, na antiga casa da esquina da Rua Generoso Siqueira com a Rua Cuiabá (hoje Avenida Olinto Mancini), fundada por João Magiano Pinto e Letícia Magiano Pinto.
Entre os 12 e 17 anos, trabalhou em um açougue e na faxina de um clube em Três Lagoas. 
Em 1942, com apenas dezessete anos de idade, com a finalidade obter documentos para trabalhar, ingressou no Exército, no então 18º Batalhão de Caçadores - 18º BC, em Campo Grande, como voluntário, onde permaneceu por três meses, tendo sido, em seguida, transferido de volta para Três Lagoas, como integrante do 33º Batalhão de Caçadores - 33º BC, onde recebeu a convocação para ir à guerra.
Conheceu a namorada, Dona Orlandina, com quem é casado até hoje, por volta de 1942.
Embarcou para a Itália em 22 de setembro de 1944, no 2º Escalão de embarque, no navio americano General Mann, juntamente com outros 5.074 militares, sob o Comando do General Oswaldo Cordeiro de Farias, Comandante da Artilharia Divisionária da 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária - 1ª DIE.
Integrou a Força Expedicionária Brasileira - FEB, sendo o Soldado nº 407, do 11º Regimento de Infantaria, de São João Del Rei – MG, tendo lutado contra os nazistas na Itália, entre 23 NOV 44 a 17 SET 45, e participado ativamente das batalhas de Monte Castello, Porreta Terme,Montese, Mazzarosa e da rendição da 148º Divisão de Infantaria Alemã, em Fornovodi Taro.
Regressando da Itália, desmobilizado do Exército, ficou um tempo desempregado, trabalhou fazendo cortinas e até mesmo fazendo caixões de defunto.
Começou a trabalhar, em 1948, na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos onde, até hoje, anualmente, participa dos festejos natalinos encantando as criancinhas atuando como Papai Noel.
Em 30 de abril de 1949, casou-se com a Sra ORLANDINA VIANA DA MOTA, a sua “Gioconda”, que havia conhecido antes da guerra. 
Criou o Museu da Força Expedicionária Brasileira e teve a iniciativa de erigir o Monumento da FEB, na Av. Afonso Pena, ambos em Campo Grande – MS, e, também, o Monumento da FEB, em Aquidauana - MS, no interior do 9º Batalhão de Engenharia de Combate – 9º BE Cmb, única organização militar da Região Centro-Oeste que participou da guerra na Itália.
Fundou, em 1985, a Seção Regional de Mato Grosso do Sul da Associação Nacional dos Veteranos da Força Expedicionária Brasileira – SR MS / ANVFEB, com a finalidade de estreitar e prolongar os laços de camaradagem e de solidariedade humana, entre os veteranos e os seus familiares, assim como rememorar a história e as glórias do Brasil, na 2ª Guerra Mundial e, ainda, defender os interesses dos veteranos. Desde então, vem sendo, reiteradas vezes, eleito o seu Presidente, tendo, por esse motivo, recebido o apelido de “Ditador”.
Hoje, com seus 95 anos de existência, pela sua conduta como cidadão exemplar, na guerra e na paz, durante toda a sua vida, tornou-se pessoa pública bem conhecida em Mato Grosso do Sul e no Brasil, tendo recebido diversas condecorações e títulos, tais como a Medalha de Campanha da FEB, do Governo Brasileiro, por ter participado na guerra, Medalha Marechal Mascarenhas de Moraes, da Associação Nacional dos Veteranos da Força Expedicionária Brasileira - ANVFEB, Medalha do Mérito Força Expedicionária Brasileira, da Assembléia Legislativa do Mato Grosso do Sul - ALMS, Medalha da Vitória, do Ministério da Defesa - MD, Sócio Emérito do Instituto Histórico e Geográfico do Mato Grosso do Sul – IHGMS, dentre muitos outros.
Sua vida tem sido objeto de livros, tais como, “HERÓI DE DUAS GUERRAS – Jornada de um ex-combatente”, de Lívia Scalon, Sandra da Rosa Lorenz, e Thiara Lima (UFMS, 2006), “FEBIANOS – Histórias e recomeços”, de Maria Madalena Dib Mereb Greco (IHGMS, 2015), e artigos, tais como “Entre a lembrança dos ex-combatentes, e a bela missão da FEB”, de Wellington Corlet dos Santos (O ESTADO, 19 SET 2015), e “Sou um velho inimigo do tempo”, dele próprio (O ESTADO, 14 MAIO 2016).
Num curto espaço de uma hora e meia, viajamos juntos no tempo por 95 anos e eu  tive a honra de compartilhar um pouco dessa História de vida do Sr Agostinho, “ex-combatente” da Força Expedicionária Brasileira – FEB, aquele cara que sempre está 99,9% bem.

(*) Wellington Corlet dos Santos
Vice Presidente da ANVFEB – MS; associado ao IHGMS e ao IGHMB; Ex-integrante das Missões da Paz UNAVEM III e MINUSTAH.
Curriculum Lattes: http://lattes.cnpq.br/0699889065439615


 

Autor: Wellington Corlet dos Santos

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